quinta-feira, 11 de abril de 2013

Retratos de São João del-Rei em 1818, segundo John Luccock - IV: fé em Deus e pé na "trava"*


"A igreja que a todas demais sobrepuja em aparência exterior, se bem que não em categoria, é a de São Francisco, que se acha numa praça de tamanho regular, na melhor parte da cidade, mas que, porém, tal como grande parte dos outros edifícios sagrados, está ainda por terminar. Isto não impediu que nela tivéssemos ouvido missa, entre andaimes e guindastes, e ali observássemos uma congregação de fiéis, mais séria e atenta tanto às rezas quanto ao sermão do que todas quantas até hoje vi, em qualquer país católico ou localidade da região romana.

Quando terminada, esta igreja há de produzir excelente impressão. É toda feita de granito e terá uma frontaria flanqueada de duas torres e uma representação em escultura dos padecimentos de São Francisco. A outra, que já foi descrita,  é atualmente munida de uma só torre, que se acha destacada dela. Acham-se porém, em curso,  projetos de reconstrução da fachada, com dois campanários que, de acordo com o desenho apresentado, serão altos e bem proporcionados.

Um terceiro destes edifícios, que ainda não foi consagrado, ocupa também posição proeminente, feito de arenito que contém certo teor de ferro, mas ainda não se acha pronto para ser aberto ao público e as obras parecem seguir com tardança.

Numa quarta, na qual, devido a atraso meu, não cheguei a entrar, dizem existir  ornamentos esplêndidos e um interior todo recamado de ouro. Nalguns dos campanários acham-se suspensos sinos de peso considerável, circunstância essa que grandemente me admirou, pois que cada um deles deve ter sido trazido do litoral através das montanhas, suspenso entre dois burros feito uma liteira.

Em prol da religião, contudo, os brasileiros primitivos venceram grandíssimas dificuldades, melhorando o mais que podiam suas igrejas e delas fazendo quase que os únicos exemplares de bom gosto arquitetônico."

John Luccock, São João del-Rei, 1818.

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* A expressão popularmente repetida é "fé em Deus e pé na tábua". A opção por "Fé em Deus e pé na trava" é uma homenagem à são-joanense Conceição Assis dos Santos, que aos 93 anos, em 2012, feito pausa apagou-se como uma vela, silenciosa, numa manhã de domingo na antiga, retorcida, sinuosa e musical Rua Santo Antônio.

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